Com investimento previsto de R$ 809 milhões, o governo promete construir terminais de passageiros em quatro portos marítimos e fazer importantes reformas em outros dois, até o fim de 2013. Todas as obras deverão começar em cinco meses, no máximo, segundo estabelece o cronograma oficial. A intenção, além de criar 45 mil leitos temporários durante a Copa do Mundo de futebol de 2014 e reforçar o sistema hoteleiro, é ajudar no processo de reurbanização das áreas portuárias das cidades.”Todo mundo escondia o porto. Nosso objetivo é ter uma convivência harmônica com as comunidades locais”, diz o ministro-chefe da Secretaria de Portos, Leônidas Cristino.
Seis cidades passarão por obras. Salvador, Recife, Fortaleza e Natal ganharão terminais – hoje, não existe uma única estrutura adequada para receber passageiros em toda a região Nordeste. Em Santos, o cais será realinhado. No Rio, um píer em formato de Y será construído e terá seis berços exclusivos para a atracação de navios de passageiros. Atualmente, existem apenas duas posições para atracação, mas elas são compartilhadas por cruzeiros e grandes embarcações de cargas.
“Era um projeto para a Olimpíada, mas resolvemos antecipá-lo para a Copa do Mundo”, explica Leônidas Cristino, referindo-se às obras no Rio. Nas cidades onde não houver berços exclusivos, o compartilhamento de posições poderá ocorrer, principalmente na baixa temporada, mas “os navios de passageiros terão prioridade” para a atracação.
�? exceção do porto de Mucuripe, em Fortaleza, cujo projeto inclui uma linha de VLT (veículo leve sobre trilhos) com estação próxima ao terminal de passageiros, todas as obras já obtiveram licença ambiental prévia e estão com licitações em curso. Além das seis cidades, o governo prevê construir ainda um terminal fluvial em Manaus, sob a responsabilidade do Ministério dos Transportes e com investimentos previstos de R$ 89 milhões.
No maior porto do país, o de Santos, a capacidade de receber turistas mais do que duplicará com os investimentos. Na última temporada, o porto registrou o embarque e desembarque de 1,1 milhão de passageiros, com crescimento de 30% na comparação com o período anterior. Com as obras concluídas, até o fim de junho de 2013, Santos poderá receber 2,5 milhões de pessoas por temporada.
Apesar do otimismo do governo em ter as obras prontas em menos de dois anos, algumas complicações podem frustrar as expectativas, se não forem contornadas. Na semana passada, o Tribunal de Contas da União (TCU) paralisou a licitação para as obras do píer carioca, alegando indícios de irregularidades. A concorrência estava prevista para este mês. Para o TCU, há suspeita de sobrepreço de R$ 45 milhões. O tribunal pediu correções no edital para liberá-lo.
Para a Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos (Abremar), os portos têm hoje uma estrutura “caótica” e “à base de improvisos” para receber os passageiros. Nos portos do Nordeste, segundo Márcia Leite, coordenadora de infraestrutura da entidade, os turistas desembarcam literalmente entre contêineres. “Por isso, recebemos com grande alegria as informações sobre esses projetos”, afirmou.
Márcia diz que lamenta o fato de que, com exceção de Salvador, nenhum dos projetos foi discutido com o setor. Mesmo assim, ela ressalta que não há evidências de que as reformas nos portos vão passar pelos atrasos que estão sendo verificados nos aeroportos. “Será um grande legado da Copa”, afirma.
As limitações de infraestrutura fizeram as operadoras de cruzeiros marítimos diminuir, pela primeira vez em vários anos, o número de navios na costa brasileira durante a próxima temporada. Serão 17 navios, segundo a Abremar, três a menos do que na alta temporada de 2010/2011.
Apesar dos elogios aos planos do governo, a associação tem duas preocupações envolvendo esses projetos. A primeira é sobre o que ocorrerá durante o período de obras, especialmente com os acessos às zonas portuárias. Márcia lembra que cada grande cruzeiro que atraca em Salvador, por exemplo, gera uma demanda de 20 ônibus lotados de turistas para conhecer a cidade. O temor é de que haja dificuldades com estacionamento, acesso viário e conforto até o torneio esportivo.
Para depois da Copa do Mundo de 2014, a grande preocupação é com o nível de tarifas que serão cobradas para movimentos de manobras (praticagem), atracação e permanência. As duas últimas taxas são livres e teme-se uma espécie de “tarifaço”. “Já existem terminais contando com a recuperação dos investimentos, o que é justo, mas isso não pode ocorrer no curto prazo”, avalia Márcia.
Se isso acontecer, segundo a executiva da Abremar, os gargalos de infraestrutura podem ser resolvidos, mas o crescimento do setor ficará limitado pelo alto custo de operar no Brasil. “Dependendo do que ocorrer, poderemos ter mais terminais, mas menos navios de passageiros.”
Um estudo feito recentemente pela associação demonstrou que as taxas de embarque e desembarque de passageiros em Santos são 398% maiores do que as cobradas no porto de Civitavecchia (Itália), 266% superiores às de Túnis (Tunísia) e 190% acima das de Barcelona (Espanha). No caso da praticagem, serviço obrigatório na maioria dos portos, que prevê auxílio de profissionais aos comandantes para manobras dos navios, a tarifa por manobra chega a R$ 18.952, a R$ 16.754 na Ilhabela (SP) e a R$ 10.014 no Rio de Janeiro. O valor de Santos é 2.979% mais alto do que o registrado em Port Said (Egito), 1.117% mais alto do que em Santorini (Grécia) e 670% mais alto do que em Montevidéu (Uruguai).
Os portos brasileiros ainda cobram taxas maiores para outros serviços, como bagagem e reabastecimento de água. “Os custos são muito elevados e não favorecem o aumento dos cruzeiros”, diz Márcia.